domingo, 9 de janeiro de 2011

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Cap.2 - Perigo

Raymond vai até a casa de Virgínia. Virgínia mora em um lugar modesto, no segundo andar de um meio duplex. Raymond tem uma cópia da chave do portão e uma cópia da chave de casa. Ao abrir o portão, ele pensa “Por que é que eu não caso com ela?”

Ele sobe a escada em espiral e ao chegar à porta percebe que ela foi arrombada. Então Raymond desce e pega um pedaço de cano e sobe a escada de novo, entrando cautelosamente na casa de Virgínia. As luzes estão apagadas.

Uma figura salta em cima de Raymond, munido de uma faca. Os dois brigam e o intruso corre, tentando escapar pelos fundos. Raymond em um surto de heroísmo tenta correr atrás dele, mas para diante da porta do quarto de Virgínia. Para diante da imagem de Virgínia, com a garganta cortada jogada em cima da sua cama, morta. Apenas morta.

Naquela cama não estava mais Virgínia, mas sim apenas um corpo. Apenas um corpo sem vida.


Hora do almoço. Leonardo vai até a casa de Raymond, mas Raymond não quer saber de muita coisa, apenas de chorar e dormir. “Engraçado que só quando a gente perde algo é que se dá conta do quanto ela significava.” Leonardo diz que ele precisa ter ânimo, que ele precisa superar o que está se passando. Ele vai embora e diz que volta trazendo o jantar.

Tarde. Raymond recebe uma ligação da sua mãe que o acorda. Eles conversam. Uma conversa curta. Uma conversa curta e fria. Raymond volta a dormir.

Alguém bate na porta. É um policial. “Raymond de Araújo? Eu gostaria de lhe fazer algumas perguntas. É sobre o assassinato da sua amiga.” O policial entra. Eles começam a conversar.

- Você conhece a vítima há quanto tempo?
- Desde que me lembre.
- E que tipo de relacionamento vocês tinham?
- Nós éramos amigos...
- Apenas amigos?
- Não deu tempo da gente ter algo mais... (Pausa)
- Vocês se conhecem desde criança,.mas não deu tempo de vocês terem algo mais?
- Não deu tempo.
- Ela tinha algum inimigo, alguém que não gostasse dela?
- Uns ex-namorados que não gostavam dela. Não sei.

- Bem, existe um motivo especial pela qual eu estou aqui. Uma pista. Os números 130489 estavam escritos no espelho do banheiro. Tem algum significado para você?
- Não, não tem.
- Bem, eu vou escrever os números aqui para você. Pense neles. Se tiver alguma idéia, pode ligar para o meu celular. Meu nome é Armando.

Quando o policial sai, Raymond liga para Leonardo.
- Oi, você pode pegar umas coisas que estão no meu armário, na empresa em que eu estagio?... Lá fica aberto até as oito horas... Eu te dou o segredo... Muito obrigado, amigo.

Raymond vai até o quarto, pega uma foto dele com Virgínia. Olha para ela atentamente, fecha os olhos e começa a chora. E fica chorando baixinho por um tempo. Então ele escuta um barulho. Um barulho vindo da sala. E as luzes se apagam.

Raymond caminha devagar até a sala. As luzes estão apagadas. Raymond pega o vaso e caminha cautelosamente. Onde está o interruptor? Então uma figura caminha cautelosamente com uma faca atrás do Raymond. Num ímpeto Ray joga o vaso nele e corre até a cozinha, mas a figura que invade o apartamento do Ray pula em cima dele e tenta lhe dar uma facada. A faca pega de raspão na coxa do Ray, que começa a lutar no chão contra o invasor. Outra facada! A lâmina penetra um pouco no ombro do Raymond que grita de dor, mas que consegue dar um murro no seu agressor. Uma terceira facada! Talvez Raymond fosse morrer neste instante, com parte da faca de cozinha no seu abdômen, sendo agredido na própria casa por uma pessoa que não conseguia enxergar o rosto por causa de... uma meia! Talvez duas. Como ele conseguiu entrar?

Quando a figura invasora se prepara para dar uma quarta facada, Raymond lhe dá um murro nos genitais (por que nunca ninguém pensa nisso?). A faca cai no chão e Raymond joga a figura para a sala. Ele vai até a cozinha, até a área de serviço, sangrando e começa a gritar por socorro, pega a vassoura (céus, como dói a facada!), liga a luz da área. Então escuta a porta da sala sendo aberta e passos rápidos. Alguém descendo as escadas correndo. O filho da puta... foi embora.

Ele vai para a sala, fecha e tranca a porta. A faca? Onde ela está? Ele fica com a vassoura na mão, sentado no chão esperando algum dos vizinhos aparecer. Ninguém aparece. Que mundo é esse?

Quem aparece, depois de algum pouco tempo é Leonardo, o amigo de Raymond. Os dois tem uma conversa um pouco tensa. Alguém entrou no apartamento do Raymond e o atacou. Levou alguma coisa? Nada! Antes tivesse levado! Raymond dá um abraço em Leonardo e começa a chorar.

(O que ele estava pensando, desde que o assaltante fugiu, é que havia uma chance grande daquele ser o mesmo homem que matou Virgínia. O mesmo homem que matou a sua amiga de infância, e a única coisa em que Ray foi capaz de pensar foi em fugir e pedir socorro, fugir!)

Leonardo faz uns curativos em Raymond, mas é melhor que ele vá para um hospital. O corte no abdômen parece ser profundo. Nunca nada assim tinha acontecido no condomínio. Mas a segurança é péssima, o porteiro deixa qualquer um entrar. Uma vez apareceu uma mulher com umas radiografias pedindo dinheiro, mas ela ficava de olho mesmo era nos móveis que haviam na casa, do portão.

- E as coisas do meu armário?
- Eu coloquei na mesa. Uns papeis, dois cadernos e um livro queimado.
- Eu poderia ver o livro antes da gente ir?
- Tudo bem, eu vou ligar para a Sofia, enquanto isto.

Raymond pega o livro. A capa está em péssimas condições, mas parece ter lago de legível nela ainda. Um resto da sua forma original ainda está lá, o vermelho que era a sua cor original e não o marrom e o negro – negro cinza – além do resto do que parece ser um símbolo. Alguma coisa redonda, com algo que parece ser uma cruz, não!, uma cruz não, um sinal de mais, só que estranho nas pontas.

Na contra capa, algo pode ser lido.
Este diário pertence a Ray##nd de Ara###

- Meu? Isso já foi meu?

Ray vasculha as páginas, mas a maior parte do conteúdo já foi devastado. Uma folha se destaca. Nela tem um desenho de criança. Um Dragão com quatro asas e três olhos que na verdade são rubis. (Mas como eu sei que essas bolinhas dos olhos dele são rubis?)

Ele vasculha mais um pouco as páginas. Encontra uma legível.

13 de Abril de 1989, quinta feira

hoje eu fiz uma coisa feia mamãe gritou muito comigo e disse que se o homem da casa grande não fosse bom a mamãe podia ter que pagar pra ele. eu a vi também levou uma bronca da mãe dela. hoje a gente foi brincar mais o alexandre mais o alexande é um covardi e nem foi com a gente. então eu e a vi fomos entrar escondidos na casa do homem que mora numa casa grande mais eu não sabia que ele tinha um cachorro grande que sabia achar com o nariz..

Aquele dia!!! E está escrito com a letra do Raymond! Aquele dia em que a mãe da Virginia disse pra ela parar de andar com o Raymond e em que eles ficaram distantes por alguns anos, até meados da puberdade. Aquele dia que o deixou com certos traumas, e, principalmente, com uma enorme culpa. Culpa por tudo!

Ray continua a ler. Porém, a cada palavra que ele lê, ele se desliga mais do mundo. Leonardo o chama e fala com ele, mas a sua voz vai desaparecendo até não mais existir, e junto da sua voz a sensação de estar sentado, o vento entrando pela janela do quarto, o peso do diário nas mãos... todo e qualquer sinal de realidade some, inclusive as palavras que ele está lendo, até que ele não lê mais nada, mas escuta um Raymond de seis anos narrando o acontecido para ele.

Quando Ray dá por si, não existe mais nada. Um vazio sem fim. A única coisa que poderia se dizer que estava lá com ele, embora não se sentisse que realmente estava lá, era um espelho. E neste espelho Raymond via refletido em sua superfície um Raymond com uma máscara no rosto. Uma mascara de Raymond. Ray ergue o braço direito e encosta no espelho, e no instante em que o faz, a superfície espelhada racha. E então a máscara que o Raymond dentro do espelho tinha no rosto, a máscara de Raymond, cai. E Ray vê que, por embaixo da máscara, não há rosto nenhum. Então o espelho some, o reflexo some, tudo some e surge um Dragão, um Dragão com quatro asas e rubis no lugar dos olhos. E este Dragão abocanha Raymond de uma única vez.

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